terça-feira, 27 de agosto de 2024

Relembrando D&D 3e

“ É razoável dizer que cada tempo tem suas malesas, mas um grande mal sempre acomete as pessoas independente da época em que vivam. O mal de pensar que a resposta para todos os seus problemas está no novo, no que ainda está por vir. Esse pensamento cria uma sensação constante de ansiedade, deixando o indivíduo muito mais suscetível a ser mal orientado e manipulado. Aprendam, jovens, que a resposta não está no futuro. Está na compreensão e uso sensato dos ensinamentos dos mestres do passado”.

- Grande Patriarca Miklotov, 1º Sumo-Sacerdote de St. Cuthbert no mundo de Elgalor.

Saudações, guerreiros da Luz.

Assim como a maioria dos veteranos e verdadeiros jogadores de D&D, acompanhei com horror as notícias que chegaram nos últimos meses sobre o novo “D&D”, intitulado pelos Bruxos da Costa como “D&D 2024”. Se em D&D 5e de 2014 havia poucas coisas a serem elogiadas (as raças do jogo são muito bem descritas e caracterizadas no livro do jogador), essa nova edição destruiu qualquer vestígio da essência e moral de D&D que havia sobrevivido à famigerada 4ª edição e aos esforços pós pandemia de transformar a 5ª Edição em um MMO de papel repleto de sensibilidades e debilidades que infelizmente marcam a cultura ocidental dos dias atuais.

Durante algum tempo, alguns outros jogadores descontentes com os rumos da 5ª edição produziram novos jogos, como aconteceu com os excelentes Tumbas & Tigres, Old Dragon II e a mais nova versão de Castles & Crusades. No meu caso particular, segui a linha de outros, como a Free League Publishing (Lord of the Rings 5e) e procurei trabalhar D&D 5e de forma a trazê-lo o mais perto possível daquilo que o jogo era na época de AD&D e D&D 3e. Todos esses esforços, apesar de admiráveis, surtem pouco efeito, uma vez que jogadores atuais não desejam aprender novos sistemas, especialmente sistemas que apreçam mais restritivos, e muito menos jogar uma aventura de fantasia medieval com regras caseiras quando podem jogar uma aventura estilo super-heróis com D&D 5e.

Por essa razão, daqui em diante dedicarei nesse espaço tempo para mostrar o valor da última boa encarnação de D&D, a 3ª Edição. Mesmo eu pessoalmente preferindo AD&D, reconheço que mecanicamente D&D 3e é melhor desenvolvido, e com poucos cuidados (sim, “cuidados”, e não “ajustes”) ele oferece uma experiência de jogo muito superior à de D&D 5e em todos os sentidos.

Neste primeiro pergaminho, tratarei de algumas inverdades e preconceitos que têm surgido contra a 3ª edição nos últimos anos. Depois, trarei algumas regras opcionais simples que utilizava em minhas campanhas de D&D 3.5 (meu grupo aderiu a essa versão, mas de modo geral, preferíamos a original, e por isso, retrocedemos D&D 3.5 em alguns pontos) e que agregavam muito valor. Mas por hora, analisemos as principais críticas de D&D 3e e reflitamos o quanto de verdade elas de fato carregam:

1) D&D 3e É MUITO MAIS COMPLICADO E DIFÍCIL DE JOGAR DO QUE D&D 5e

Isso não é verdade. A criação de personagens em D&D 3e, por exemplo, é mais rápida do que a de D&D 5e, já que não temos o conceito de background. Em termos de regras, sim, D&D 3e tem regras para tudo, mas isso não significa que todas precisem ser aplicadas para um bom jogo, e não significa, de modo algum, que jogadores e mestres precisem conhece-las a fundo. D&D 5e trabalha com mecânicas de ações bônus, ações livres, vantagem e reações, que com frequência são mais complicadas do que os criticados “bônus de circunstâncias” de D&D 3e. Apesar do sistema de perícias de D&D 5e ser mais simples e enxuto (o que tem um lado muito positivo), o de D&D 3e, apesar de exageradamente complexo, só representa um trabalho real para personagens Ladinos e Bardos. Guerreiros, clérigos, magos, paladinos e feiticeiros precisam escolher apenas 2 perícias + modificador de Inteligência e se focar nelas. D&D 3e não é perfeito, mas não é complicado, além de ser muito mais verossímil do que D&D 5e. E como costumo dizer a meus jogadores, é melhor ter no livro uma regra que não precisamos usar do que precisar de uma regra e ela não existir (o que acontecia com certa frequência quando jogávamos D&D 5e).

2) D&D 3e É IMPOSSÍVEL DE SE CONTROLAR PORQUE EXISTEM MUITOS LIVROS E SUPLEMENTOS, O QUE FAVORECE DEMAIS O JOGO BASEADO EM PERSONAGENS DE “COMBOS”.

Outra crítica que não é verdadeira. Todos os suplementos oficiais de D&D 3e começam com a indicação de que aquele conteúdo é OPCIONAL e pode ser usado apenas com a permissão do mestre. Todos os suplementos de D&D 3.5 voltados para jogadores (sejam eles oficiais ou não) usam como atrativo de venda a ideia de deixar os personagens jogadores mais fortes por meio de classes de prestígio, e praticamente todos eles são livros ruins que, admito, não deveriam existir. Mas considerar o sistema problemático por conta disso é um forte exagero. Meu grupo, como muitos dos mais antigos, utilizava apenas os três livros básicos e alguns suplementos de ambientações e bestiários. Classes de prestígio eram proibidas a menos que aparecessem em um desses livros e fizessem muito sentido na campanha. Isso não impediu que fossem criados personagens memoráveis e divertidos. Pelo contrário, nos incentivou a buscar soluções para melhorar as “classes quebradas” (monge e bardo) de modo que as mesmas passassem a funcionar bem e de acordo com o que cada jogador esperava.

3) PARA SE CRIAR UM BOM PERSONAGEM EM D&D 3e É PRECISO CONHECER MUITO BEM AS REGRAS E TODOS OS SUPLEMENTOS

Das três principais críticas, esta, em minha opinião, é a mais absurda. É verdade que D&D 5e, por meio de suas subclasses e independência de feats/talentos, traz personagens “prontos” que tecnicamente são poderosos em seus nichos. No entanto, as classes são tão desequilibras e mal desenhadas que algumas são absurdamente mais poderosas do que outras, a um ponto em que chega a ser engraçado. Em D&D 3e, se você utiliza apenas os livros base, mesmo precisando escolher feats/talentos, mesmo um jogador iniciante consegue criar um ótimo personagem com um pouco de leitura prévia; se o jogador iniciante decidir fazer uma classe complexa como um mago, por exemplo, tudo o que ele precisa está na classe de seu personagem e em suas magias. Na hora de escolher talentos, basta ler os que são associados à magia e estão disponíveis para seu nível atual. Se o mestre ajudar nesse processo (o que sempre deve ser feito), a questão é resolvida em menos de 10 minutos quando temos classes complexas, e em menos de 3 quando as classes são mais simples. D&D 5e já traz seu personagem praticamente pronto, mas como as classes são desequilibradas, isso não é garantia de se ter um bom personagem. Qualquer dúvida nesse sentido, basta criar um monge ou ranger em um grupo que possui um bárbaro ou paladino para entender bem a questão.

4) OS COMBATES DE D&D 3e SÃO MUITO LONGOS E MAIS COMPLICADOS.

Uma crítica menor, mas que também aparece. E assim como as outras, não é verdadeira. Há em D&D 3e muitos modificadores a serem contados. O número de ataques desferidos, em vários casos, também é maior. Esses dois fatores, quando combinados a um grupo de pouca experiência ou com dificuldade para fazer pequenos cálculos, realmente faz o combate ser mais demorado do que gostaríamos. Mas não há complicação alguma aqui, apenas um pouco de lentidão por conta de pequenos cálculos matemáticos. Em D&D 5e, em contrapartida, é preciso gerenciar muito mais ações (reações, ações bônus, ações livres, desengajar...) e isso sim torna o combate mais lento e complexo. Outro ponto a ser considerado: Enquanto em D&D 3e magias como Benção concedem um bônus fixo (ex: +1), em D&D 5e isso é feito pela rolagem de dados (ex: +1d6), e mesmo com o número menor de ataques por rodada, esses fatores tornam o combate de D&D 5e mais complexo e um pouco mais demorado do que o de D&D 3e.

Em suma, D&D 3e não é complexo, difícil ou inacessível, pelo contrário. E por poder ser baixado gratuitamente com facilidade, é um jogo que vale à pena se conhecer ou voltar a jogar quando nosso objetivo é jogar uma boa aventura de fantasia medieval, que honre clássicos como Dragonlance, O Senhor dos Anéis e tantos outros. Mas se o objetivo do grupo é brincar de “Avengers” usando espadas e cajados sem o risco real de derrota ou morte, D&D 5e e principalmente Wokes & Dragons 2024, são opções mais apropriadas.

2 comentários:

  1. Gronark, o Senhor do "Amor"28 de agosto de 2024 às 10:56

    O patriarca está errado em toda a sua doutrina! Ele teme a mudança pois ela possibilita que as pessoas se libertem e abracem o “amor”, destruindo toda ordem e tabus que os oprimem. Não irá demorar para que os livros sagrados dessa divindade tola sejam queimados enquanto o povo se afoga em gula e sodomia, HAHAHAHAHAHA

    Os livros das edições antigas já estão proibidas de serem jogadas, tanto que aqueles que compram as versões virtuais atuais recebem notificações de como o jogo era “opressor, colonialista e preconceituoso”. Mas não se preocupe, pois todas crianças, que não virarem comida pra Moloch nos ventres das mães, irão abraçar o novo NO-D&D 2024, HAHAHAHAHAHAHA

    (Eu vou ser sincero, apesar de gostar bastante do AD&D 2e, eu gosto mais do 3.5 por ser mais fácil e rápido de jogar quando aprende bem o sistema. É como eu sempre digo, “o 3.5 é bom para quem tem a mentalidade do AD&D 2e.”

    O que eu acho engraçado é quando dizem que tem muitos livros e combos no 3.5, mas se esquecem que na 5e rola mais combos a cada livro tendo arquétipos e multi-classes bizarras como bruxo-paladino. Mas o que realmente torna o 3.5 melhor que a 5e é que o jogo pode ser jogado em qualquer nível sem perder o controle. Na 5e o grupo passou do nível 9º-10º nível já começa a ser complicado de se manter o jogo pois a escala de poder dos personagens é muito grande. Já no 3.5, bizarramente o meu irmão e o Thiago conseguiam fazer desafios mortais pro Vardalon (que já estava lá pelo nível 50º) sem apelar demais e quebrar o jogo. Até mesmo eu jogando o Arlland/Archaon (que está no nível 33º) a campanha se desdobra sem problemas.)

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    1. Sábias são as palavras do Patriarca, demônio, uma vez que elas carregam em si o poder para destruir a influência corrupta que você e seus servos poderiam exercer sobre corações incautos. O sábio não teme a mudança, da mesma forma que a luz não teme a escuridão. Estes e outros livros sagrados perdurarão, enquanto suas produções abjetas, como Wokes & Dragons 2024 estão fadadas a cair no esquecimento.

      (É interessante mesmo ver como a própria WotC demoniza seus livros antigos como forma de promover as péssimas versões atuais como as "salvadoras do RPG". Eles chegaram inclusive a criar um painel em um evento interno intitulado "Como D&D 5e salvou o RPG de mesa". Um absurdo maior do que o outro. Sobre D&D 3, ele é realmente mais intuitivo e bem organizado do que o AD&D. Como sistema de regras, mesmo eu admito que funciona bem melhor.

      E concordo com você sobre a questão dos combos; em D&D 5e, eles existem em abundância (paladino/bruxo é a coisa mais aberrante que pode existir, mas em D&D 5e o próprio sistema conspira para fazer essa combinação sem sentido ser extremamente eficiente), com a diferença de que enquanto D&D 3e dá suporte para mestres lidarem com qualquer coisa em qualquer nível, em D&D 5e o mestre está por conta própria quando o grupo atinge o 10o nível, já que o poder começa a escalar demais, as disparidades entre as classes começam a ficar gritantes e os monstros que deveriam proporcionar um desafio digno mal conseguem se manter de pé por mais de duas rodadas. Fora que um grupo que tenha esgotado praticamente todos os seus recursos em um combate sempre tem a opção de fazer um "descanso curto" e estarem aptos para continuar. A título de comparação, em D&D 5e, um descanso de 1 hora em uma masmorra cheia de monstros recupera mais pontos de vida do que uma semana de repouso em um vilarejo em D&D 3e. Coloque tudo isso na balança e é fácil notar como D&D 3e é superior a D&D 5e quando o desejo do grupo é jogar uma campanha de fantasia medieval).

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