quarta-feira, 1 de novembro de 2023

A importância do Combate em uma boa história de aventura

Saudações, guerreiros da Luz.

Este é outro pergaminho salvo dos antigos Salões de Valhalla, e que compartilho aqui porque trata de um tema que tem sido propositalmente negligenciado e subvertido, mas que desempenha um papel muito importante dentro da criação de uma história: O combate.

Há algum tempo, li um pequeno artigo escrito por uma jovem que começara a jogar RPG durante a pandemia, onde a mesma fazia grandes elogios ao suplemento Strixhaven: a Curriculum of Chaos. 

No artigo, a garota elogiava essa nova onda de suplementos e a nova abordagem que traziam, permitindo ao jogador criar um personagem exatamente igual a ele, e se afastando cada vez mais de situações de combate. Em um ponto do artigo, a jovem destacou que era muito positivo este movimento de se criar aventuras sem combates porque era “muito traumático” criar um personagem exatamente como você e vê-lo morrer ou ser humilhado em um combate aleatório. Ela encerrou o argumento colocando que combates eram recursos usados apenas por mestres iniciantes, e que assim que os mestres encontravam seu lugar, eles deveriam deixar os combates de lado.

Quando pensei em escrever este pergaminho inicialmente, procurei o artigo para compartilhar aqui, não no intuito de ridicularizar a jovem, mas para mostrar como essa nova geração está fragilizada por falta de referências adequadas. Infelizmente, vi que o post foi deletado, provavelmente, por conta das críticas que ela sofreu não somente por sua opinião, mas principalmente pela forma como ela escolheu defende-la.

No entanto, algo realmente comum em boas histórias é o que foi descrito no primeiro episódio da mais recente temporada da série Stranger Things, que traz os jovens jogando uma campanha bastante intensa que lembra a clássica “Vecna Lives”, e o grupo se vê diante de um combate praticamente suicida
contra Vecna e seu culto. O episódio mostrou muito bem aquele tipo de situação que todos nós já vivemos onde “ou vocês conseguem um resultado absurdamente bom no dado, ou todos estão mortos”, e apresentou de forma muito verossímil o sentimento avassalador que toma conta da mesa toda em uma situação assim, independente do sucesso da rolagem.

Como todo jogador, ao assistir aquele episódio me lembrei de diversas vezes em que mestrei uma aventura e o grupo praticamente derrubava a casa em alguns combates importantes porque a menos que se saíssem muito bem (e isso dependia em boa parte da rolagem de dados), o mundo, e talvez mais importante nesse contexto, seus amados personagens, estariam perdidos. Houve, em diversas aventuras, momentos emocionantes que não envolviam combates, mas nenhum deles conseguia evocar tanta emoção nos jogadores quanto aqueles combates com verdadeiro significado, em que eles eram testados além de seus limites.

Eu estaria mentindo se dissesse que tudo sempre acabou bem; em algumas ocasiões, o grupo foi derrotado, seja por um erro de cálculo de um dos jogadores ou porque os deuses dos dados decidiram não colaborar. Mas mesmo diante da derrota, os jogadores ainda se sentiam satisfeitos com a aventura e confronto em si, e logo que se recobravam, já começavam a planejar outros personagens que trariam os originais de volta ou terminariam o que eles tão bem começaram.

Em suma, meu ponto é que uma boa aventura jamais é construída somente em cima de combates, especialmente combates aleatórios que quando usados em demasia com as atuais mecânicas de descanso longo/curto, transformam o RPG em um mero MMO sem alma. Mas aliado a um bom enredo, o “bom combate”, aquele com significado dentro da campanha e para os jogadores, sempre foi e sempre será um dos maiores pilares de D&D, e provavelmente, aquele que proporcionará o maior grau de engajamento e emoção entre os jogadores. Sobre a questão “traumática” de se perder um personagem, penso que toda aventura de fantasia deve trazer algum risco e desafio, porque sem isso, ela perde muito de sua essência. É bastante simples compreender isso tentando imaginar como seriam grandes clássicos como O Senhor dos Anéis se o mundo fosse um gigantesco “espaço seguro” onde não houvesse risco para ninguém.

Assim, para aqueles que estão começando no hobby, e principalmente para os veteranos que estão formando novos grupos, deixo minha sugestão de que o melhor caminho não é construir aventuras de D&D longe de combates desafiadores para evitar traumatizar novos jogadores. Isso os privará de partes importantes do que é uma aventura de fantasia, e, pior, os tornará ainda mais frágeis na vida real. O melhor caminho, a meu ver, é preparar seu grupo para a ideia de que uma aventura é feita de riscos, e grandes legados frequentemente são construídos somente após sermos levados a nossos limites. A satisfação que os jogadores terão em enfrentar e eventualmente derrotar um grande desafio será extremamente gratificante, e no caso de derrota, a mesma pode ser uma preciosa lição, ao ajudar este jogador a enfrentar frustrações e se tornar uma pessoa mais resiliente, o que o ajudará imensamente a lidar com a vida real e os desafios que ela invariavelmente impõe a todos nós.

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