quinta-feira, 17 de agosto de 2023

Paladinos e a representação moral por trás de um jogo

Saudações, guerreiros da Luz.

Sempre disse, em tom de brincadeira, que para conhecermos o valor de um jogo ou sistema de fantasia medieval, bastava vermos a forma como os mesmos descreviam a classe paladino.

Independente se lidamos com RPGs de mesa ou MMOs, a forma como o paladino é descrito acaba dizendo muito sobre o lore, profundidade e riqueza de vários aspectos do jogo em si. Essa brincadeira se provou bastante acurada nos últimos anos, e hoje, com o lançamento iminente de One D&D, ela se prova mais verdadeira do que nunca.

A título de comparação, colocarei abaixo a descrição original (em inglês, para que não haja a inevitável parcialidade na tradução que eu poderia fazer) da classe paladino como aparece em dois livros de RPG publicados recentemente, e depois, a descrição presente no documento oficial de One D&D. Em cada ponto, destacarei alguns elementos importantes nas descrições, e depois, farei uma breve análise das mesmas.

 LIVRO DO JOGADOR D&D 5ª Edição:

A paladin swears to uphold justice and righteousness, to stand with the good things of the world against the encroaching darkness, and to hunt the forces of evil wherever they lurk. Different paladins focus on various aspects of the cause of righteousness, but all are bound by the oaths that grant them power to do their sacred work. Although many paladins are devoted to gods of good, a paladin’s power comes as much from a commitment to justice itself as it does from a god. Paladins train for years to learn the skills of combat, mastering a variety of weapons and armor. Even so, their martial skills are secondary to the magical power they wield: power to heal the sick and injured, to smite the wicked and the undead, and to protect the innocent and those who join them in the fight for justice.

Almost by definition, the life of a paladin is an adventuring life. Unless a lasting injury has taken him or her away from adventuring for a time, every paladin lives on the front lines of the cosmic struggle against evil.

Fighters are rare enough among the ranks of the militias and armies of the world, but even fewer people can claim the true calling of a paladin. When they do receive the call, these warriors turn from their former occupations and take up arms to fight evil. Sometimes their oaths lead them into the service of the crown as leaders of elite groups of knights, but even then their loyalty is first to the cause of righteousness, not to crown and country.

Adventuring paladins take their work seriously. A delve into an ancient ruin or dusty crypt can be a quest driven by a higher purpose than the acquisition of treasure. Evil lurks in dungeons and primeval forests, and even the smallest victory against it can tilt the cosmic balance away from oblivion”.


Aqui temos uma descrição simples, mas suficientemente clara sobre o que é um paladino. Ela não é completa como a de D&D 3ª Edição ou mesmo como a do AD&D, mas especifica que o paladino é um indivíduo que luta por justiça, mantém os ideais de retidão em seu comportamento e focam-se na proteção dos inocentes, ajuda aos feridos e destruição das forças do mal. Em relação à fonte de seus poderes, fica especificado que os mesmos vêm tanto do seu comprometimento com a causa da justiça quanto de um Deus alinhado com as forças do Bem. Como tudo em D&D 5ª edição, fica colocado à disposição do jogador uma enorme quantidade de poder, mas poucas responsabilidades sobre o que fazer com ele. Ainda assim, sem explicitar claramente o que ocorre quando um paladino age os valores norteadores da classe, é possível entender que ele é um bom indivíduo, e que deve fazer o bem.

PLAYER’S HANDBOOK DE CASTLES & CRUSADES 7ª Edição:

In the constant battle between good and evil, a select few, through their selfless devotion, courage,
nobility of spirit and unyielding faith
, rise to the forefront of the
struggle. 
These holy warriors strike terror in the hearts of evil creatures, and inspire others to greater good. The paladin’s consistency and strength knows only the limits of their deity and codeThe paladin is a holy warrior chosen for adherence and absolute devotion to a deity or similar holy cause. Some are trained in all the arts of combat, serving in the vanguard of many wars and movements. Their belief in the tenets of their deity gives them strength and divine powers beyond those of other warriors. A paladin’s code requires them to respect legitimate authority, act with honor, help those in need and punish those that harm or threaten innocentsThey can serve priests, temples, religious houses or other religious authorities, but obey only one calling.

The paladins serve their code alone. They are defined by their actions, and their actions are dictated by their code. These holy warriors are driven by virtue, courage, nobility and the quest to combat evil in all forms. They ride for no master but their deity or cause. The greater good guides their actions, and victory is its own honor. Paladins fight on lonely battlefields and protect the weak. These warriors fight and die for the greater good; often unsung, alone and beyond the reach of succor.

Though paladins are often maligned for their zealous actions, or feared for their powers, all hold them in high regard, for they wage an unflagging war against evil. A paladin’s power flows from strength of will and the ability to project divine power against the enemy. Their purpose, if misunderstood by many, is quite clear to them, and always guides their actions. They are servants of the law, and are bound to their code forever. They serve the greater good and always place it above all else.

Every deity or pantheon has a moral code that dictates what is acceptable on the battlefield. A paladin’s weapons of choice are generally those of the paladin’s deity or of a knightly sort, for paladins eschew cowardly combat and believe facing one’s enemy in battle is the highest honor. They never use weapons associated with thieves or the cowardly, and generally refuse to use ranged weapons, though some of them are not averse to using them if absolutely necessary. Paladins never knowingly associate with evil characters under any circumstances. A paladin ends all associations with those who consistently offend their moral code or refuse to help in the causes the paladin considers worthy. A paladin who ceases to perform his duties or strays from the path of righteousness, who wilfully commits an evil act or who grossly violates the code of conduct loses all abilitiesincluding the service of the paladin’s divine mount. The character is outcast and cursed, and no longer advances in strength or power. Only by atoning for these violations of the code may such a paladin regain the status and powers.

ALIGNMENT: Lawful good

Desnecessário comparar a riqueza de detalhes na descrição da classe apresentada em D&D 5ª Edição e Castles & Crusades. Em minha opinião, mesmo considerando as “pedras fundamentais” do AD&D e D&D 3ª Edição, esta é a melhor descrição da classe Paladino que já foi escrita em livros de RPG. Ela deixa extremamente claro o que é um paladino, como ele deve se comportar, com quem ele pode se associar, de onde vêm seus poderes e o que acontece se ele se desviar de seu caminho. As virtudes do paladino são citadas de forma bastante enfática: Devoção, Coragem, Altruísmo, Nobreza de Espírito e... Inabalável Fé. Eles são guerreiros sagrados, servos dos deuses, ligados a um forte código moral. Obrigatoriamente, devem ser Leais e Bons, porque, ao mesmo tempo que são servos da ordem, devem obrigatoriamente colocar o bem maior em primeiro lugar, acima de tudo. Esta tão simples menção, presente na descrição de C&C, era algo que faltava em D&D 3ª Edição, e que resolveria todos os conflitos oriundos tanto da confusão do arquétipo “leal e estúpido” quanto do fanático, desvios comuns na classe quando a mesma é interpretada por jogadores inexperientes ou mestres e desenvolvedores que não compreendem o significado do alinhamento Leal e Bom). Seria possível escrever um pequeno livro apenas analisando essa descrição da classe, e como ela explica magistralmente o que é um paladino. Um verdadeiro paladino. Um detalhe fascinante nessa descrição é a frase abaixo:

“These warriors fight and die for the greater good; often unsung, alone
and beyond the reach of succor”

Estes guerreiros lutam e morrem pelo bem maior; frequentemente sem ser mencionados em canções, sozinhos e além de socorro”. Aqui fica claro que paladinos não são “legais” ou “glamorosos”. Suas vidas são extremamente difíceis, e completamente dedicadas ao bem maior. Simplesmente brilhante em minha humilde opinião.

Agora que analisamos uma descrição satisfatória e a melhor descrição já feita da classe, vejamos a pior caracterização já escrita da classe:

 ONE D&D

"Paladins are united by their oaths to stand against the forces of annihilation and corruption. Whether sworn before a god’s altar, in a sacred glade before nature spirits and fey beings, or in a moment of desperation and grief with the dead as the only witnesses, a Paladin’s oath is a powerful bond. It is a source of power that turns a devout warrior into a blessed champion. A Paladin swears to stand against corrupting influences and to hunt the forces of ruin wherever they lurk. Different Paladins focus on various aspects of these causes, but all are bound by the oaths that grant them power to do their sacred work. Paladins train to learn the skills of combat, mastering
a variety of weapons and armor. Even so, their martial skills are secondary to the magical power they wield—power to heal the sick and injured, to smite their foes, and to protect the helpless and those who fight at their side. Almost by definition, the life of a Paladin is an adventuring life, for every Paladin lives on the front lines of the cosmic struggle against annihilation. Fighters are rare enough among the ranks of a world’s armies, but even fewer people can claim the calling of a Paladin. When they do receive the call, these blessed folk turn from their former occupations and take up arms and magic. Sometimes their oaths lead them into the service of the crown as leaders of elite groups of knights, but even then, their loyalty is first to their sacred oaths, not to crown and country. Adventuring Paladins take their work seriously. A delve into an ancient ruin or a dusty crypt can be a quest driven by a higher purpose than the acquisition of treasure. Malign forces lurk in dungeons, and even the smallest victory against them can tilt the cosmic balance away from oblivion".

Olhos um pouco atentos podem perceber que a descrição presente em One D&D teve como base a
descrição do Livro do Jogador de D&D 5ª edição. Dada a proposta de One D&D, não há nada inesperado aqui. No entanto, um olhar um pouco mais cuidadoso mostra que TODAS as menções a Bem, Mal, Ordem ou Justiça foram removidas da descrição. Os paladinos de One D&D agora lutam contra a “corrupção” e “aniquilação”, dois conceitos extremamente vagos e propositalmente subjetivos. O paladino de One D&D não é um guerreiro sagrado (holy warrior), mas sim, um guerreiro “abençoado” (blessed warrior). Se a diferença parece sem importância à primeira vista, basta nos lembrar que Warloks/Bruxos são também “abençoados” por seus patronos abissais e demoníacos. Enquanto a descrição do paladino de D&D 5 era propositalmente vaga em aspectos importantes, e de One D&D deixa bem claro os valores que defende e aqueles dos quais está gritantemente fugindo.

Se a subversão do paladino de One D&D ainda está difícil de ver, recomendo que façam uma última reflexão: Peguem homens como Adolf Hitler, Joseph Stalin e Mao Tsé-tung, três dos maiores assassinos que o mundo já viu. Todos eles se enquadrariam como perfeitos paladinos dentro de One D&D; todos dedicaram suas vidas a acabar com a “corrupção” onde viviam e o fizeram porque estavam tentando evitar a suposta “aniquilação/obliteração” de seus respectivos povos.

CONCLUINDO...

Muito pode ser lido sobre um jogo, história ou sistema, pela forma como paladinos são retratados. Enquanto jogos como AD&D, D&D 3ª Edição, Old Dragon e principalmente Castles & Crusades trazem representações dignas do paladino, refletindo um claro respeito pela tradição e legado de fantasia, One D&D subverte completamente a classe e inclusive o faz sem tentar se esconder. Por isso,
reforço que apoiar esse sistema é contribuir para a destruição de D&D e “corrupção” dos mais jovens que adentram o hobby. 

2 comentários:

  1. Gronark, o Senhor do "Amor"17 de agosto de 2023 às 14:59

    Os valores dos paladinos foram atualizados, senhor do ventinho. Agora eles não precisam mais se apegar a tolices como bondade e ordem. Agora esses campeões abençoados podem ser, e fazer, aquilo que quiserem! O número de paladinos de Moloch sacrificando crianças é alarmante nesses dias, HAHAHAHAHAHA

    Falando em paladinos, uma das minhas cultistas, Makenzie de Armas, que é dito ser autista, fez uma personagem “canônica” em D&D que é uma paladina autista que criou o artefato caótico, que praticamente é uma roleta russa, conhecido como o “baralho das surpresas”. Agora sabemos que essa garota, através de sua personagem, que criou esse artefato que existia antes mesmo dela nascer, e não um homem branco e patriarcal chamado Gary Gigax, nem D&D ele e o Arnerson criaram, e sim a Wizards, HAHAHAHAHAHAHA

    Não se preocupe, Ventania! Eu estarei aqui para sussurrar palavras de “sabedoria” nos ouvidos dos jovens e abrir a mente deles para os valores da “modernidade e do amor”, HAHAHAHAHAHAHAHA

    (Nos jogos que participo foi aliviado a restrição do paladino em relação a ordem, podendo haver paladinos neutros e bons ou caótico e bons, tanto que o Amaris, meu paladino meio-elfo de Trithereon, é caótico e bom. Ultimamente meu irmão e o Thiago começaram a discutir se não daria pra liberar paladinos leais e neutros de Saint Cuthbert, Pholtus e Al'Akbar (Na nossa mesa o deus baklun é um deus maior e com a igreja dele sendo bem semelhante ao islã da tariqa turca/otomana.

    Sobre essa Makenzie eu posso dizer, pelo que vi, ela é tão autista quanto eu sou uma mulher. Pelo que vi dos vídeos dela falando, ela não demonstra nenhuma debilidade ou deficiência social, e eu tenho um doutorado de psiquiatria e um mestrado em psicologia. Eu me pergunto qual é a TEA que essa garota se enquadra, porque na frente de uma câmera ou escrevendo no twitter ela não demonstra nada! Me pergunto se algum “especialista” não teve algun$ “incentivo$” pra dar um diagnóstico disso pra ela e de quebra a garota ganhar um “escudo da diversidade social”. O engraçado é que usaram uma garota assim pra apagar ainda mais o nome do Gygax do legado do jogo justamente pra ninguém criticar a “garota com deficiência”. Quase igual o que fizeram com o Gygax, Greenwood e o Easley.)

    https://www.youtube.com/watch?v=MJqs9Xp1ihw
    https://twitter.com/MakenzieLaneDA

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    1. Tolo Filho do Caos, acha mesmo que sua "paladina" que se autopromove usando uma deficiência que ela provavelmente não possui e seus escravos da WotC podem mesmo apagar a história? Suas crias abissais estão corrompendo o presente e destruindo o futuro, mas jamais serão capazes de alterar o passado. Estou aqui precisamente para garantir isso. E não estou sozinho nessa contenda; muitos paladinos (verdadeiros) estão trabalhando nisso também.

      (Sobre a flexibilização do alinhamento do paladino, como conversamos, eu concordo que seja feito dentro de certos limites em grupos experientes, como o seu ou meu. Interessante você mencionar paladinos leais e neutros de St. Cuthbert, porque em Elgalor, na Teocracia de Loregard (governada pelos Patriarcas devotos de St. Cuthbert) há uma ordem de paladinos leais e neutros. Mas em grupos iniciantes, minha recomendação é sempre que nos mantenhamos dentro do alinhamento Leal e Bom, para que os mais jovens entendam bem o que é um paladino.

      Sobre Makenzie, estou escrevendo um post para tratar especialmente dessa incrível "paladina" que se apropriou claramente, com as bênçãos da WotC, de uma das criações de mestres como Gygax. Como você bem disse, além dela jogar D&D há cerca de 5 anos, o item já havia sido criado muito antes dela ter sequer nascido. Vejamos até onde o Escudo da Diversidade dela resiste às consequências de seus atos).

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