quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

D&D e os "clérigos" dos tempos modernos

Saudações, guerreiros da Luz.

Anos atrás, quando voltei a escrever motivado pela execração de tudo aquilo que era sagrado no RPG e fantasia medieval no pré e pós pandemia, uma das coisas que mais me incomodaram foi ver a forma como clérigos estavam sendo retratados. Em 2022, quando voltei a ler a respeito, fiquei pasmo em ver como a questão da devoção aos deuses e a religião estavam sendo sutilmente descartadas, dando lugar a poderes divinos que eram atribuídos aparentemente do nada, exigindo pouco ou nenhum comprometimento por parte do clérigo.

Três anos se passaram, e como era esperado, a situação não melhorou. Hoje, por meio de romances e HQs fracassados licenciadas pela WotC e shows “modernos” como a Lenda de Vox Machina e Mighty Nien, vemos os clérigos transformados em verdadeiros mandingueiros, que “negociam” poderes com “entidades sobrenaturais” guiados pela conveniência e paixões atuais. Completamente oposto ao clérigo que tínhamos nos tempos de AD&D e D&D 3. Completamente opostos aos dedicados servos dos deuses, que viviam conforme o dogma de seu deus sendo um exemplo a ser seguido, um sábio, um mestre e um professor. Aquele que antes era o pilar moral do grupo hoje foi reduzido a (mais) um personagem egoísta, vazio, indisciplinado e moralmente fraco.

Desde o lançamento da quarta edição de D&D, pudemos notar uma mudança preocupante na forma como paladinos e clérigos passaram a ser tratados em termos conceituais, e isso, infelizmente, foi fundamentado na 5ª edição do jogo e agora, com a chegada de D&D 2024, foi “sacramentado” pelos poderes do Caos.

No Livro do Jogador de D&D 5ª Edição, o clérigo é descrito como um agente dos deuses, como sempre foi em edições anteriores. No entanto, quando o jogador começa a criar o personagem, ele se depara com domínios, e não com deuses em si. É verdade que em cada domínio há uma pequena lista de divindades pertinentes, mas não há, em momento algum, qualquer descrição daquelas divindades (isso só viria dois anos depois, em um suplemento voltado para Forgotten Realms, e ainda assim, de forma bem modesta). Dessa forma, um jogador iniciante constrói seu clérigo com base puramente nos Domínios que apresentam poderes que considera mais interessantes, mas a essência do clérigo, que é o deus que ele segue e representa, foi propositalmente obscurecida e colocada de lado.

Essa ausência proposital dos deuses no livro do jogador me incomodou no início, mas em 2014, quando o livro saiu, pensei ser apenas uma implicância da minha parte. No entanto, conforme novos domínios foram surgindo, foi ficando cada vez mais claro que o que importava para os clérigos em D&D 5ª edição eram poderes de domínios, e não divindades. As divindades, quando mencionadas em livros e suplementos, eram mais tratadas como um aspecto de fundo em certos cenários, e algo que não precisava ser visto com muita atenção, já que o que importa é a “liberdade” para montar seu personagem “sem amarras”.

Tanto que no sofrível The Wild Beyond The Witchlight pôde observar, além do costumeiro festival de horrores na forma de panfletagem subversiva, temos Mercion, uma clériga que é descrita perfeitamente dentro do ideal de “mulher empoderada” e, conforme a agenda pede, ela também é ateísta, dadas as devidas proporções do termo quando tratamos cenários de fantasia. Ela não cultua nenhum deus, nem mesmo os reverencia. Todo o poder divino que canaliza vem de dentro dela própria. Afinal, por que um clérigo precisaria de um deus?

Diante dessa situação deplorável e desrespeitosa, o melhor que nós, veteranos que tivemos a benção de conhecer o jogo em outra época, podemos fazer, é barrar tal profanação em nossas campanhas e lembrar os jogadores o que um verdadeiro clérigo é. Nesse contexto, tenho dois exemplos da fantasia que, em minha opinião, são extremamente preciosos.

O primeiro deles é Lua Dourada da ambientação Dragonlance. Uma mulher verdadeiramente forte por conta de sua humildade, fé e devoção. Em um tempo em que os deuses haviam deixado o mundo, junto de seu companheiro Vendaval ela buscou sinais dos deuses e devido a sua compaixão, bondade, força de caráter e fé, foi escolhida como a escolhida de Mishakal, a deusa da cura. Quando brigas e discussões rompiam no grupo, era dela a voz suave, porém firme dela que acalmava os ânimos e unia. Quando o medo, desesperança ou desespero começavam a tomar os corações dos heróis de diferenças formas, era a luz dela que os lembrava de quem eram e da importância daquilo que precisavam fazer.

O segundo exemplo pode gerar certa controvérsia, mas é Gandalf, de O Senhor dos Anéis. Estou ciente que Gandalf é visto acertadamente como um excelente exemplo de mago, mas se considerarmos sua origem, missão como agente divino, e personalidade, notamos que em termos ideológicos, ele é muito mais próximo de um clérigo do que de um mago; ele foi enviado por Poderes Superiores com a missão de guiar os povos livres (guiar, não liderar) na luta contra a Sombra. Ele recebeu poderes divinos para ajudar nessa missão, e sempre agiu como conselheiro, sábio, protetor e guardião; ele sempre foi a “rocha” na qual a Sociedade do Anel se formou. Ele não foi o grande herói da história, mas sem suporte, sabedoria e forte presença, nada teria sido feito.

Para Lua Dourada e Gandalf, o bem-estar do grupo e sua missão sagrada estava sempre em primeiro lugar. Ambos se sacrificaram, de diferentes formas, para proteger e orientar seus companheiros, e deram tudo o que tinham para que no fim o bem pudesse prevalecer. Isto é um clérigo de verdade. Alguém que por meio da devoção e sabedoria nos guia nos momentos mais escuros, trazendo a melhor versão de nós mesmos que existe dentro de cada um.

Este é o exemplo que devemos seguir, não os mandingueiros egoístas e patéticos que os Bruxos da Costa e seus “influencers” tentam nos empurrar para afastar os mais jovens daquilo que é certo, moral e divino. 

2 comentários:

  1. Gronark, o Senhor do "Amor"12 de dezembro de 2025 às 10:40

    Os deuses já foram superados, caolho! Artanis sempre esteve certo, e agora os mortais são livres para buscarem qualquer vício, ou perversão, sem ter medo de sofrer alguma punição por uma entidade autoritária! No fim, o “amor” pode ser praticado sem limites, HAHAHAHAHAHAHA

    O novo e “verdadeiro” D&D nos deu o clérigo “absoluto”! Que agora não precisam de deuses, mas apenas “acreditar em si mesmos” para receber seus poderes, iguais aos juramentos abstratos dos “verdadeiros” paladinos! O melhor exemplo para isso é a Mercion, que adora a si mesma, a beleza, as artes e pune qualquer um que a contrarie. Ela é literalmente a combinação de “garota empoderada” com “clérigo moderno”. Também não podemos nos esquecer das clérigas “modelos” de Critical Role, como Pike, que no inferno ela abandona sua deusa, removendo seu símbolo sagrado, e descobrindo que o seu poder vem dela mesma. E também a Jester, a tiefling azul que recebe seus poderes graças a sua esquizofrenia e os usa para atacar pessoas com pirulitos e dildos mágicos! Me diga se há clérigos mais verdadeiros que elas? Tem aquele anão, do Fairbanks, que faz “acordos” com deuses, mas não me recordo o nome dele. Mas sei que ele serve o “amor” também, HAHAHAHAHAHA

    Aproveitando que falei de Jester. No último episódio mostrou como meus servos do Critical Role fomentam o “orc smut e romantacy”. Já que a clériga demente achou um livro chamado “Tusk Love” (o livro é real mesmo). Claramente uma referencia a como as garotas de hoje não querem mais um paladino ou clérigo certinho, mas sim um orc forte, viril, másculo que irá usar sua força para domina-las. Esse é o futuro, Odin! E não se preocupe, o “futuro” vai chegar para Elgalor e Edrin também, assim como chegou para Terra Média e a Roda do Tempo, HAHAHAHAHAHAHAHA

    E saiba que agora meus servos da Merdflix são donas da Warner, logo eles possuem a Terra Média (Senhor dos Anéis e o Hobbit), DC, Mad Max, Duna, Harry Potter, Mortal Kombat, Game of Thrones... e até mesmo o poderoso Godzilla (Monsterverse)! Imagine as “delicias” que meus servos irão fazer com todas essas histórias. Já adianto, se achou Senhoris do Lacre horrível, imagine o que eles vão fazer com a obra de Tolkien! A animação “Guerra das Empoderadas de Rohan” foi só um aperitivo. Mas antes precisamos profanar Nárnia, HAHAHAHAHAHAHAHA

    [O D&D praticamente acabou com o charme das classes, mas quem realmente sofreu foram os clérigos e paladinos. Mas é aquilo, os jogadores de hoje precisam ter personagens que são avatares super poderosos deles mesmos, então o clérigo precisa ser ajustado para não ofender ateus militantes. A prova cabal disso é a Mercion, que só preciso ver a descrição dela. É uma forma de dizer que ser narcisista é correto e até mesmo sagrado. Praticamente a ideologia do século 21 na consagração do “Eu, Só Eu e Apenas Eu”.

    Tem um vídeo que fala um pouco sobre fanfictions e que indiretamente tá relacionada a essa glorificação narcisista que está ocorrendo na mídia. Vale a pena ver, pois explica a origem do romantacy e essa auto-indulgência que está contaminando o entretenimento em geral.

    https://www.youtube.com/watch?v=x3NPxraALq0

    Enquanto a Merdflix e a Warner, só ver o que fizeram com Castlevania para ver o nível de respeito que essa empresa tem pelas obras. Mas eu admito que chega ser engraçado, pois a Disney conseguiu destruir e “marvelizar” o Predador. Agora imagine o que vão fazer com o Godzilla, se bem que a Toho tem uns poderes de veto que pode parar qualquer maluco de destruir o lagartão.]

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    1. Pérfida cria do Abismo, o seu "amor" jamais suplantará a Verdade, da mesma forma que seus "clérigos" que retiram seu poder da autoconfiança (embasada em absolutamente NADA) jamais farão frente àqueles cujo poder vem diretamente dos deuses, em reconhecimento a uma vida de devoção, sabedoria, altruísmo e sacrifícios. Já lhe adianto que tais blasfêmias jamais germinarão em mundos como Elgalor ou Edrin.

      (Eu honestamente havia me proposto a parar um pouco de falar daquilo que o Critical Role produz, para que não parecesse uma implicância pessoal, mas vejo que é impossível, porque eles representam, disseminam e incentivam o pior que existe dentro do contexto rpgístico. Os piores personagens, piores conceitos, piores distorções... Chegamos a um ponto que é impossível citar algo ruim e errado que está acontecendo sem relacionar diretamente com um personagem criado pelo grupo. Todos os "clérigos" que apresentaram até aqui exemplificam perfeitamente a crítica que fiz nesse mergaminho, como você muito bem exemplificou. Não preciso nem entrar no mérito do "paladino"/bruxo que é pirata e desenvolve habilidades de ladino; como você bem disse, os clérigos e paladinos, os bastiões morais de qualquer grupo, foram os mais atingidos por essa onda progressista e subversiva que tomou conta de D&D. O que é natural, uma vez que quando demônios pretendem profanar um templo, a primeira coisa que precisam fazer é se livrar dos guardiões que estão à porta.

      Um outro ponto bastante preocupante que as histórias de Critical Role traz é a relativização do mal e a insistência em se fazer piada com temas como abuso e "orc smut". Em suma, eles representam tudo o que há de errado nos novos ventos que carregam D&D de alguns anos para cá. É a clássica consagração do “Eu, Só Eu e Apenas Eu”, como você mencionou. Não existem mais personagens, apenas avatares. Não há desafio ou superação pessoal, apenas satisfação de desejos.

      Sobre a compra da Warner, sim, também vejo como uma notícia terrível. A mesma destruição que a Disney causou em propriedades intelectuais como a Marvel e Star Wars, acometerão agora outras obras consagradas. O senhor dos Anéis ainda está relativamente protegido, porque os direitos continuam pertencendo à Embracer Group (que recentemente teve boa parte de suas ações compradas por um fundo árabe), mas o futuro definitivamente não é promissor. As últimas declarações que li sobre o novo filme de Nárnia, que será uma "releitura moderna do clássico" me deixaram bastante preocupado. No fim, serão tragados pela própria lama, como já aconteceu com a Disney, mas muitas boas obras e seus fãs sofrerão nesse meio tempo).

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